20 kms de Cascais 2014

(+1 km de bónus)

*Para entenderem este texto tenho que fazer uma introdução ao meu petit nom. Nasci José Emílio, típico português, o primeiro nome de herança hebraico-cristã e o segundo de tradição romana (momento Canal História). No dia do meu nascimento o meu avô paterno “batizou-me” logo de Zémi, street name que usei até ao final do ciclo, 11 anos. Portanto, e pese embora hoje em dia quase ninguém me chame assim, Zémi sou eu! 

Depois da meia maratona dos descobrimentos, onde fiz uma entorse, ainda não tinha corrido 20 kms, e era com uma mistura de vontade e de ansiedade que me dirigi à prova. É que há algo nestas provas longas de ter sempre o fado de me correr muito mal. E, para piorar a perspectiva, nos dias anteriores antecipava-se que a corrida seria feita com vento e debaixo de chuva.

ZÉ: Assim pela manhã, lá cheguei a Cascais, o tempo confirmou-se húmido e sombrio e a prova convidavam mesmo a correr sozinho durante duas horas. Apetecia-me mesmo correr sozinho, já há muito tempo que não o fazia, ajuda limpar a cabeça.

Decidi que ia fazer uma prova calminha, sem ligar a ritmos. Na partida encontrei dois colegas que partiam para fazer mais ou menos uma prova calma, o João e o Rui, e fui ao lado deles. Os primeiros 3 kms recebiam-me com umas subidas difíceis, pelo que resolvi ir devagar e chamar o lado mais pragmático que há em mim… MI!

MI: Já era sem falta ires com calma, estás sempre a treinar para ir mais longe mais rápido, sempre a esticar os limites. Eu sei que tu adoras correr, mas sempre que tens uma paixão nova é a mesma coisa, ficas desaustinado, neste caso sôfrego por um novo recorde, e amuado quando não consegues… dás TODO DE TI e mais um pouco numa tentativa de consumar esse objectivo. Como se sentisses essa necessidade só para mostrar que gostas de correr.

Essa tua insegurança que te leva a uma necessidade permanente de andar no limite acaba por ser contraproducente.

Não sei se já reparaste, mas nas corridas, parece que dás dois passos e aparece-te uma lesão. E depois, quando estás parado,  durante a recuperação da lesão sentes-te como um amante incompreendido, abandonado, separado da amada, prostrado num longo langor doloroso a pensar que nunca mais poderás estar com ela, ansioso como um tigre preso dentro de uma jaula, a andar impaciente de um lado para o outro, desejoso de voltar a correr.

Lembras-te, no 1º ano do ciclo que, de tanto gostares de fazer rir “aquela” rapariga que se sentava ao teu lado em Matemática, vos tiveram que separar? Não ficaste desolado? Tanta sofreguidão não te prejudicou?

ZÉ: Mi…

MI: O quê, vais dizes que não é verdade? Já foi há quase 30 anos e continuas igual. É um padrão de comportamento teu…

ZÉ: Mi, estás-te a esticar. Agora a sério cala-te…

MI: Nem sequer lhe chegaste a dizer porque é que gostavas de a fazer rir…

ZÉ: MI CALA-TE!!!

MI: Mas porquê, não gostas de ouvir as verdades?

ZÉ: ehhh porque hoje em dia ela é amiga do Blog?

MI: Ahhhhhhhhhhhhh, pois é… olha acabou a rampa, agora é a direito, se calhar podes continuar tu.

A partir do 3º Km, colei-me à lebre dos 6 min/km durante uns minutos, mas depois precisava de acelerar um pouco para me sentir à vontade... até aos 5:30

MI: E fizeste muito bem, encontras-te o teu espaço e apreciaste a corrida pelo que ela é, com todas as suas perfeitas imperfeições, todas as suas curvas apertadas e rectas longas, com o piso liso ou paralelepípedo esburacados.

ZÉ: ao 5º km recebo a primeira garrafa de água, bebo um pouco e guardo o restante para o 10º km...

MI: E se aproveitares a viagem, pode ser que te apercebas que se calhar não és só tu que gostas da corrida, pode ser que tenhas de aceitar que se calhar a corrida também gosta de ti, se calhar não nesse registo competitivo mas na tua faceta mais inocente, tranquila e amigável. Acho que não "te amas" o suficiente, tens falta de amor próprio. Se deres tempo ao tempo apercebes-te que ela poderá gostar mais de ti nesse registo, do que do "Cristiano Ronaldo" neurótico que há em ti... E pode ser que se ela gostar de ti, no final tenhas uma surpresa.

ZÉ: ha ha ha que piada... Só faltava trazer o Joel aqui dentro da minha cabeça, olha e já agora venha o Ricardo que tenho pensado nele desde que adoeceu. Ele ia gostar desta prova...

MI: Vês estás a entrar no espírito... mas olha não são muitas pessoas dentro da tua cabeça, não fica pesada?

ZÉ: Ao 10º km ingiro o primeiro gel, e vou bebendo a garrafa de água. Pela primeira vez, bebo sem problemas com a respiração.

Sensivelmente no 11º km cumprimento o primeiro elemento do Blogue que passa por mim já no caminho de regresso... (suspense)

SURPRESA! era a Sofia. Não estavam nada à espera pois não? E uns minutos depois segue-lhe o marido.

Já referi o cheiro a maresia a aumentar à medida que me aproximava do Guincho? Refiro agora, excelente sensação...

Algures no 13º km o Eduardo e o Pedro surpreendem-me e passam por mim.

Ao 15º km encontro o Mário (cunhado do Ricardo), a Rita e o Pedro dos Surf Runners, e mantenho-me com eles. Era a altura do 2º abastecimento de gel, mas as mesas de distribuição de água já estavam vazias. Comecei a ficar preocupado. Mas no 16º km a carrinha da organização, trouxe improvisadamente água aos corredores.

Ao 17º km reparo que o meu GPS não acompanha a quilometragem da prova, e ao 18º km no GPS confirmo que estamos no 17º da prova. Seria o GPS que estaria errado ou a organização da prova?

Ainda assim e aproveito ter recuperado a respiração da última subida da prova, para alargar a passada e aumentar o ritmo para algo abaixo dos 5' ao km (faltavam 2 kms segundo as minhas contas).

Ao 20º km, depois de dois kms a correr como um louco apercebo-me que ainda tenho mais um km pela frente... e é já com "dor de burro" que apanho uma rapariga com 40's anos (que não conheço de lado nenhum), que tinha vindo comigo durante a maior parte da viagem e sprintamos juntos para a meta.

Resultado final 1h 52m 56s num total de 21 kms. Se a prova tivesse mais 100 metros tinha batido o recorde da meia maratona...

MI: Não aprendeste nada com o que eu te disse pois não?...

ZÉ: Concluindo, pela primeira vez fiz uma prova longa sem faltas no planeamento, sem lesões parvas e principalmente a correr do principio ao fim. Sinto-me realizado.